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Terça-feira, 17 de Setembro de 2024

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ATIVISMO JUDICIAL: A RELAÇÃO ENTRE AÇÕES COLETIVAS E POLÍTICAS PÚBLICAS

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ATIVISMO JUDICIAL: A RELAÇÃO ENTRE AÇÕES COLETIVAS E POLÍTICAS PÚBLICAS
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ATIVISMO JUDICIAL: A RELAÇÃO ENTRE AÇÕES COLETIVAS E POLÍTICAS PÚBLICAS

 

Por Adilson Garcia

 

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Respeitante ao controle das políticas públicas, o Judiciário é acionado para resolver através das ações coletivas as opções políticas da Administração, tais como construção de hospital, de creche, atendimentos na área da saúde, educação etc.

Resulta disso um papel de ativismo judicial gigantesco, via processo coletivo, que tem esse escopo.

O STF é a grande instância de garantia dos exercícios de direitos lançados na Constituição e tem, no nosso ver, exercido o papel de guardião.

Inúmeros temas controvertidos passaram a ser decididos por juízes, como a Reforma Política (estabeleceu a fidelidade partidária), células-tronco, aborto de fetos anencéfalos, etc.

O Ativismo Judicial pode ser definido como uma postura proativa do Pod­er Judiciário que interfere de maneira regular e significativa nas opções políticas dos demais poderes.

Há uma certa confusão existente entre “ativismo judicial” e “judicialização da política”. A distinção estaria na origem da atuação judicial: o ativismo deriva da vontade do intérprete proativo; na judicialização o ativismo provém da vontade do legislador e o judiciário manda cumpri-la, o que é a maioria das hipóteses no caso Brasileiro.

 

Entretanto, o processo coletivo brasileiro precisa avançar nos moldes Norte Americanos, onde há o “defining function” (ativismo judicial), que é a soma de poderes atribuídos ao juiz do processo coletivo incomensuravelmente maior que no Brasil.

Esse instituto do direito norte-americano nas class actions permite que o juiz autorize a alteração do pedido e da causa de pedir garantindo ao réu o direito defesa, contraditório e tudo o mais. Lá no processo coletivo deles o juiz pode a) Instruir o processo de forma mais acentuada do que o processo individual; b) impor flexibilização procedimental; c) pode o juiz desvincular-se do pedido ou da causa de pedir.

E o que seriam políticas públicas? Políticas públicas para Höfling (2001) seriam projetos de governo, através de programas e ações voltadas para setores específicos da sociedade. Sob a ótica da luta de classes Claus Offe propõe a intervenção estatal, não se esquecendo do neoliberalismo de Milton Friedmam, defensor do Estado Mínimo, passando pelo desafio do Século XVII de substituir o rigor monárquico, fundado no absolutismo de Hobbes (Leviatã) e pela norma geral e abstrata preconizada por Locke, Montesquieu e Rosseau.

O Estado liberal contemporâneo não guia a sociedade, mas as Constituições impõem objetivos gerais e especiais (NASCIMENTO, 2011).

 

 

Nesse embate, no Brasil é corriqueira a utilização da teoria da Reserva do possível, malferindo o mínimo existencial e direitos prestacionais. A reserva do possível (leia-se insuficiência de recursos) regula a possibilidade e a extensão da atuação estatal no tocante à efetivação de alguns direitos (como, p. ex., os direitos sociais), condicionando a prestação do Estado à disponibilidade de recursos públicos.

A reserva do possível é uma construção da doutrina alemã que coloca, basicamente, que os direitos já previstos só podem ser garantidos quando há recursos públicos.

Gilmar Ferreira Mendes, ao dissertar sobre direitos fundamentais enquanto direitos a prestações positivas, assim se pronunciou: “Observe-se que, embora tais decisões estejam vinculadas juridicamente, é certo que a sua efetivação está submetida, dentre outras condicionantes, à reserva do financeiramente possível ("Vorbehalt des finanziell Möglichen"). Nesse sentido, reconheceu a Corte Constitucional alemã, na famosa decisão sobre "numerus clausus" de vagas nas Universidades ("numerus-clausus Entscheidung"), que pretensões destinadas a criar os pressupostos fáticos necessários para o exercício de determinado direito estão submetidas à ‘reserva do possível’.”

 

Preleciono que essa teoria surgiu na Corte alemã ao analisar demanda judicial proposta por estudantes que não haviam sido admitidos em escolas de medicina de Hamburgo e Munique em face da política de limitação do número de vagas em cursos superiores adotada pela Alemanha em 1960.

A pretensão foi fundamentada no artigo 12 da Lei Fundamental daquele Estado, segundo a qual “todos os alemães têm direito a escolher livremente sua profissão, local de trabalho e seu centro de formação”.

Ao decidir a questão o Tribunal Constitucional entendeu que o direito à prestação positiva – no caso aumento do número de vagas na universidade – encontra-se sujeito à reserva do possível, no sentido daquilo que o indivíduo pode esperar, de maneira racional, da sociedade. Ou seja, a argumentação adotada refere-se à razoabilidade da pretensão.

Na análise de Ingo Sarlet, o Tribunal alemão entendeu que “(...) a prestação reclamada deve corresponder ao que o indivíduo pode razoavelmente exigir da sociedade, de tal sorte que, mesmo em dispondo o estado de recursos e tendo poder de disposição, não se pode falar em uma obrigação de prestar algo que não se mantenha nos limites do razoável”.

Pelo argumento democrático, as normas que preveem direitos prestacionais não têm a capacidade de torná-los exigíveis diante do Estado, pois o Judiciário seria incompetente para dispor sobre orçamento público, cabendo apenas ao legislador.

Entretanto, essa competência reservada ao legislador para elaboração da lei orçamentária não é absoluta por sujeitar-se às normas constitucionais e, portanto, ao controle judicial.

Há uma certa dificuldade em aplicar a “reserva do possível” no Brasil porque é uma adaptação mal feita dos exegetas pátrios da jurisprudência constitucional alemã, por causa das disparidades sociais existentes entre a Alemanha e o Brasil, pois condicionar os direitos econômicos, sociais e culturais à existência de recursos “disponíveis” no contexto brasileiro seria igual a reduzir a eficácia à zero ou relativizar sua universalidade.

 

Enfim, não há como utilizar a Alemanha como paradigma.

Considerando que o Direito visa alterar a realidade, não faria sentido nem teria utilidade regular por normas a realidade social tal qual ela se apresenta. A justificativa de falta de recursos não prospera, pois no meu ver o problema está nas prioridades e violação de outras normas.

Assim, a tese da reserva do possível é incoerente e obstáculo intransponível à efetivação dos direitos sociais, porque muito o Brasil figure entre as dez maiores economias, a desigualdade social aqui é absurdamente gritante.

A efetividade dos direitos fundamentais não é exclusividade da Administração Pública (executivo) e do Legislativo. É obrigação de todos, inclusive do Poder Judiciário.

 

Se algum dos poderes prevaricar, cumpre aos demais suprir e, casuisticamente, o juiz avaliará o argumento e os limites da reserva do possível. 

Há algumas vantagens do ativismo jurídico concretamente no Brasil e da sua importância para a democracia, entre elas destaco: 1) atuação do judiciário como copartícipe do processo de modernização do Estado brasileiro. 2) suprir as lacunas da legislação para que prevaleça o espírito da Carta de 88.

Esse ativismo ocorre porque a intervenção do Poder Judiciário na implementação de direitos sociais não se trata de definição de políticas públicas, mas de simples respeito à Constituição.

 

Para o Ministro Celso Melo  a formulação legislativa no Brasil  lamentavelmente nem sempre se reveste da necessária qualidade jurídica, o que é demonstrado não só pelo elevado número de ações diretas promovidas perante o STF, mas sobretudo pelas inúmeras decisões declaratórias de inconstitucionalidade de leis editadas pela União Federal e pelos Estados-membros.

Esse déficit de qualidade jurídica é preocupante porque afeta a harmonia da Federação, rompe o necessário equilíbrio e compromete, muitas vezes, direitos e garantias fundamentais dos cidadãos da República.

De outro quadrante, há muitos argumentos contra o ativismo judicial. Podemos pontuar: 1) Ele fere a tripartição de poderes; 2) Ele fere a “reserva do possível”.

Para o STJ (então Ministro Luis Fux) e o STF (Ministro Celso de Melo) não há a violação da tripartição de poderes no ativismo judicial, tampouco pode-se brecá-lo com base na reserva do possível, porque o Judiciário só pode implementar políticas públicas para fazer se efetivar direitos fundamentais prometidos na CF/88.

Desse modo, o Judiciário não cria a política pública, simplesmente manda cumprir a opção constitucional.

A corrente favorável aplaude a evolução da jurisprudência, numa linha de transição. Antes não se admitia ao Judiciário intervir na definição de quaisquer políticas públicas, por óbice decorrente do princípio da separação de poderes e da discricionariedade administrativa.

A judicialização da política ocorre porque os tribunais são chamados a se pronunciar quando o funcionamento do Legislativo e do Executivo se mostram falhos, insuficientes ou insatisfatórios. Sob tais condições, ocorre certa aproximação entre Direito e Política e, em vários casos, torna-se mais difícil distinguir entre um “direito e um ‘interesse político, sendo possível se caracterizar o desenvolvimento de uma política de direitos” (CASTRO, 1997).

Tal viés da teoria da reserva do possível atrela-se à Economia. As necessidades – mesmo aquelas relacionadas aos direitos sociais – são ilimitadas e os recursos são escassos. Esse postulado, fundamento da ciência econômica, deve ser levado em conta tanto na definição das políticas públicas quanto na decisão judicial no caso concreto. Não é de fácil concreção, mormente no âmbito municipal, o elo mais fraco da tríade do Estado.

Os bloqueios de recursos públicos em face do descumprimento de ordem judicial anterior determinando o fornecimento de medicamentos, por exemplo, confirma o descabimento da alegação de impossibilidade jurídica para a efetivação de direitos sociais fundamentais, no caso o direito à saúde.

A negativa de fornecimento de um medicamento de uso imprescindível, cuja ausência gera risco à vida ou grave risco à saúde, é ato que, per si, viola a Constituição Federal, pois a vida e a saúde são bens jurídicos constitucionalmente tutelados em primeiro plano.

Assim, a decisão que determina o fornecimento de medicamento não está sujeita ao mérito administrativo, ou seja, conveniência e oportunidade de execução de gastos públicos, mas de verdadeira observância da legalidade.

Há uma relação umbilical entre ações coletivas e políticas públicas mínimas, que seriam aquelas políticas ou repasses mínimos exigidos de cada poder pelo ordenamento jurídico.

Acima dessa linha mínima, teríamos o campo da eficiência, o que juridicamente é de difícil avaliação, exigível somente de quatro em quatro anos pelo eleitorado na renovação política majoritária ou proporcional.

No Brasil a sociedade tem vários instrumentos para provocar o poder judiciário. A ação coletiva para a tutela de direitos difusos e coletivos é basicamente regida pelo conjunto formado pela Lei da Ação Civil Pública e pelo Código de Defesa do Consumidor.

Em verdade, não se trata de uma única ação, mas sim de um conjunto aberto de ações, de que se pode lançar mão sempre que se apresentem adequadas para a tutela desses direitos.

Nesse sentido, claramente estabelece o art. 83 do CDC que, para a defesa dos direitos difusos e coletivos, são admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e efetiva tutela.

Portanto, não se pode dizer, realmente, que exista uma ação coletiva. Existe, isto sim, uma categoria de ações, que recebem o rótulo de “ação coletiva”, mas que se mostram distintas entre si com as peculiaridades de cada direito carente de tutela.

A Jurisdição Constitucional dá lugar após a II Guerra Mundial com a consolidação do Estado Constitucional. Surge a Constituição como norma jurídica e não mais como um documento político.

Criaram-se nos países europeus Tribunal Constitucional e um controle de constitucionalidade das leis e as Constituições passam a integrar o centro do ordenamento jurídico. Consequentemente a supremacia parlamentar deixa de existir, situação presente nos Estados Unidos desde 1803.

Para José Afonso da Silva (2006) a jurisdição constitucional “emergiu historicamente como um instrumento de defesa da Constituição, não da Constituição considerada como um puro nome, mas da Constituição tida como expressão de valores sociais e políticos”.

Na opinião do Min. Barroso exsurge o novo papel da Constituição no Estado constitucional: “… No Estado constitucional de direito, a Constituição passa a valer como norma jurídica. A partir daí, ela não apenas disciplina o modo de produção das leis e atos normativos, como estabelece determinados limites para o seu conteúdo, além de impor deveres de atuação ao Estado...”

Por esse modelo, a Constituição é a viga central e há uma supremacia do Poder Judiciário, que detém a primazia na interpretação final e vinculante das normas constitucionais e, por isso, no meu ver o ativismo judicial é necessário e não viola a tripartição dos poderes em absoluto.  

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Adilson Garcia

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